domingo, 19 de maio de 2013

O filho de Peter W Lund.





O interesse pela vida privada das ditas “celebridades” é uma marca do mundo contemporâneo. O cientista dinamarquês Peter W Lund, com sua personalidade excêntrica, metódica e pacata, não escapou aos questionamentos sobre sua vida amorosa e familiar.

A vida privada de Peter Lund - diferentemente de sua trajetória profissional - não foi marcada por grandes aventuras, surpresas e emoções. Lund nunca se casou, nem teve envolvimentos amorosos comprovados historicamente. Alguns biógrafos citam um romance com uma italiana durante sua permanência na Europa entre sua primeira e segunda viagem ao Brasil. Outros citam um envolvimento com as filhas do Tenente Américo Coutinho da Fonseca, próspero comerciante de Lagoa Santa.

Quanto à italiana, seu filho Nereo relatou que “Lund amou uma vez na vida, e teve desejos de se casar. Mas o amor de jovem e gentil italiana que conheceu quando viajava pela Itália, não foi forte bastante para se apossar do coração do sábio, que só pulsava pela ciência”. Não há registros de encontros ou correspondências entre Lund e sua paixão italiana.

Quanto às jovens filhas do Tenente Américo, há uma história que sobreviveu no imaginário popular. Lund teria dado aulas de piano para as três Moças - como ficaram conhecidas por nunca terem se casado. Essas teriam se apaixonado pelo dinamarquês, mas não foram correspondidas. Há uma impossibilidade prática para esse ocorrido, demonstrada por uma simples verificação documental. A mais velha das Moças - Ana Ursulina - nasceu em 21/10/1862, Flávia Domitila em 27/08/1867 e a mais nova – Maria América – em 15/10/1868. Lund já passava, portanto, da casa dos 60 anos. Houve uma convivência com a família, mas um envolvimento amoroso com as jovens era improvável.

Peter Lund não teve filhos, mas educou Nereo Cecílio dos Santos - filho de um vizinho e colaborador, Luís Cecílio - como se assim o fosse. Como nos relata o próprio Nereo, “quando fui para a companhia de Lundo tinha 12 anos de idade e o acompanhei até exalar o último suspiro, sentado à sua cabeceira, pranteando-lhe o desaparecimento.”

Lund assumiu a formação de Nereo, dando-lhe uma educação refinada que incluía vários idiomas, música, literatura e noções de História Natural. Inicialmente, pretendia enviá-lo à Europa, mas desistiu da ideia diante da resistência do garoto em se afastar da mãe. Pensou em mandá-lo ao Rio de Janeiro, mas resolveu ele mesmo assumir sua educação, pois como relatou: “me foi dada pessoalmente a oportunidade de guiar sua educação. Isso foi-me preferível por motivos morais. O Rio de Janeiro não prima como uma cidade modelo por esse ponto de vista. Também sua educação literária e científica poderia ser mais bem orientada por mim, e isso parecia-me mais importante que sua educação musical.” (Carta de Lund aos irmãos.1875)

Mais tarde, Nereo tornou-se um dos auxiliares de Lund e, quando este faleceu, foi beneficiado no testamento com bens e uma pensão vitalícia que foi estendida à sua esposa. Em carta aos seus familiares, Lund justificou sua doação a Nereo: “Até agora ele tem admirado a mim como faria a um pai. Portanto, eu penso que me deveria ser permitido cuidar dele, baseado na sua devoção filial. [...] Como as duas ocupações que ele tem aqui dão muito pouco dinheiro, ele estará em uma situação muito triste quando eu morrer. Devido à relação especial em que Deus me colocou frente a esse jovem, vocês hão de entender, sinto-me na obrigação moral de prover seu futuro bem-estar no caso de minha morte. Eu não seria capaz de descansar em paz sem isso”.

Quando o Imperador D. Pedro II visitou Lagoa Santa em 1881, Nereo o recebeu na antiga casa de Lund, como seu filho. Conversaram sobre o naturalista e fez uma apresentação musical para a comitiva real. Anos depois, Nereo escreveu uma biografia sobre seu pai adotivo (O Naturalista, Imprensa Oficial, 1923).

Posteriormente, mudou-se para Curvelo e Belo Horizonte, mas a imprensa de Lagoa Santa fez vários registros de suas visitas à cidade. Faleceu em 1922 e foi enterrado em jazido no cemitério do Bonfim.

O filho de Lund não teve uma vida brilhante e próspera como desejava seu pai, mas certamente teve uma trajetória bem diferente da que teria se não tivesse cruzado o caminho do naturalista dinamarquês. A vida de Lund, certamente, teria sido mais solitária e menos estimulante sem a presença de Nereo Cecílio.

Ana Paula Almeida Marchesotti PUBLICADO NA REVISTA BEM DE VIDA, N. 36, OUT/NOV 2012, P. 10.

Um comentário:

MARIA MARILDA disse...

Ana Paula.
Conheço seu trabalho. moro em lagoa santa. Estou necessitando de dados históricos da CENTRAL do BRASIL quando Lagoa Santa recebeu dois engenheiros franceses que são citados no livro de PWLUND. Foureaux e Foulou.
Ambos vizinhos de Lund e amigos de Sr Américo.
Tem algum detalhe destes dois para fins de historiciade?
Maria Marilda-mmpcorrea@gmail.com